Inutilidades Audiovisuais: 666 Park Avenue

A espera foi longa e os salgueiros deixam cair as suas folhas nos delicados passeios e jardins. É Outono, praia para trás das costas, mantas e lareiras a prepararem o regresso. Com este quadro crepitante nenhuma outra moldura poderia conjugar melhor que as nossas queridas séries televisivas. De A a B, todas elas estão prontas. Não é que já não estivessem nos meses de calor, mas agora, sobretudo agora, ficar sentado no sofá dá outro conforto.

De parte este início lírico e outonal, remeto-me para o assunto que me apraz com regularidade, a inutilidade audiovisual. Nestas problemáticas, tal como as estações sazonais, há sempre lixo que pede incessantemente pela reciclagem. Este mês, esse lixo chama-se “666 Park Avenue”, episódio piloto.

De terror não sou fã. Nunca fui de facto. No entanto, nunca reprimi qualquer oportunidade de fazer chegar bom terror audiovisual até mim. Não sou fã de American Horror Story mas reconheço engenho no produto, por exemplo. Pelo contrário, sou um fã incondicional de um filme chamado “Rosemary’s Baby” do Roman Polanski. É deste segundo título que começo a mim dissertação. 666 Park Avenue é uma história em quê os moradores de um condomínio residencial – espécie de prédio com serviço de quartos, recepcionista e mordomias -, de seu nome titular da série, fazem um pacto com o diabo, que curiosamente é o diretor desse mesmo condomínio. O drama começa quando um jovem casal, energético e empreendedor, ganha o lugar de “tarefeiros” lá do sítio, em troca de uma residência lá no prédio. Rosemary’s Baby é um filme em que uma mulher engravida do diabo.

Nestes dois exemplos tão remotos, o prédio é um elemento fundamental de comunhão entre o bem e o mal. Na minha opinião, o terror psicológico de uma habitação, o mistério e os quartos trancados, os candeeiros e os corredores são símbolos de grande potencial medonho. Isto é realmente o aspecto mais
bem aproveitado pelo piloto 666 Park Avenue, o edifício é lindíssimo e o décor encerra fabulosos pormenores, tanto exteriores como interiores. No entanto, e para começar bem o escárnio, tudo o resto é mau. Mau, mau, mau.

O casting é medonho. Desde o porteiro ao casal protagonista, da figura do diabo à sua mulher, uma Vanessa Williams desligada do papel, que deambula entre o evil bitch e o strawberry cupcake, enquanto o seu marido esfrega um olho. Depois há um subcast, formado pelos outros moradores, que me faz espécie: um prédio tão
grande e sumptuoso e só nos é apresentado um casal de artistas liberais à beira de um descarrilamento sexual reprimido, uma outra moça cleptomaníaca e um homem doente que assassina em nome do senhorio. Pergunto-me se isto ficará por aqui, um cast tão curto e tão mal construído.

Outro aspecto que me faz confusão, para não dizer repulsa, é os CGI effects (ou falta deles). Quando o senhorio decide dar o ar da sua graça, os efeitos especiais surgem, ora eles, em todo o seu esplendor, deambulam entre uma reminiscência às séries juvenis de feiticeiros da Disney Chanel à mais bolorenta recordação do Espaço 1999. De qualquer das formas, com maus atores, ninguém leva os efeitos especiais a sério, seja de que forma for.

Não sei se 666 Park Avenue se salva. Sinceramente deu-me vontade de rir o quão mau as coisas poderiam ficar. Há pontas soltas por todo o lado: em quê que consiste o compromisso dos moradores com o diabo? Qual é o background do casal principal? Qual é o papel dos empregados e porteiros?; Por outra lado, existe pontas que, apesar de não andarem soltas, vacilam por serem demasiado óbvias, seja a reconstrução da casa que vai conduzir a história principal, seja a revelação do drive through do subcast.

Sei que muitas destas respostas vão sendo respondidas ao longo da série e que talvez esteja a apressar as minhas críticas, mas este episódio piloto é muito fraco para uma ABC aprovar a sua continuidade. Pergunto-me se será o baixar dos padrões de qualidade da produtora ou dos espectadores. De qualquer das formas, tenho mais que fazer do que conferir se, depois deste texto, estou certo ou errado.

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